Eu quem?

Vivemos connosco próprios todos os dias, a cada hora e minuto do dia. Conhecemo-nos como ninguém. Ou talvez não. Saberemos realmente quem somos, de que somos feitos e como parecemos aos olhos dos outros? É, ou não importante sabermos como os outros nos vêm e percecionam? Será fundamental os outros criarem uma imagem de nós de acordo com a que nós próprios temos? Quem somos nós e quem são os outros? Verei nos outros o que vejo em mim? Todas estas são questões que envolvem três simples conceitos: autoimagem, autoconceito e autoestima. Mas o que são estes “autos” e que importância têm?

Autoimagem

A autoimagem é, por definição, a imagem que alguém tem si próprio, ou seja, quem pensamos ser, estando superficialmente relacionada com aquilo que vemos ao espelho. No entanto, e considerando através da psicologia positiva, que este é um conceito essencial para a compreensão do self, o conceito de autoimagem é bastante mais profundo, estando fortemente relacionado com a forma como nos vemos a um nível geral, interna e externamente. No fundo, a autoimagem surge da apreciação que fazemos de nós próprios, de como nos percecionamos, resultando de um conjunto de impressões que vamos, ao longo do tempo, criando de nós próprios (sejam elas positivas ou negativas). A autoimagem é a construção interna de como nos vemos fisica, cognitiva e socialmente, podendo variar consoante os diferentes papéis que exercemos na sociedade.

Apesar disto, está fortemente relacionada com a influência da perceção dos outros sobre nós, podendo até ser ligada à infância. Isto porque o self também é formado através da interação com o outro,  especialmente numa fase inicial do desenvolvimento, em que a criança não consegue fazer uma avaliação completa de si própria. Por exemplo, se desde cedo alguém é levado a crer que é uma criança prodígio, esta crença vai influenciar a sua autoimagem e, se não for correspondente ou se não se perpetuar no tempo, pode ser um fator de frustração. Mais, o feedback de quem nos rodeia, especialmente de pessoas que nos são significativas, influencia a forma como nos percecionamos. Porquê? Porque nos obriga a questionar e nos desafia a reconstruir a nossa autoimagem, por forma a que esta se aproxime da verdade. Assim, seremos realmente como nos vemos? Sim e não. A nossa autoimagem vai-se alternado e tomando as proporções que lhe permitimos, de acordo também com a informação que retiramos dos outros e com os outros.

Autoconceito

Segundo William James, o self está divido em dois: o ego, subjetivo e relacionado com os pensamentos, e o eu objetivo, o todo que a pessoa perceciona de si. O autoconceito está relacionado com as interações sociais e a forma como eu retenho e percebo o juízo que os outros fazem de mim. É a interação entre o que pensamos de nós próprios e o que os outros pensam de nós, relacionando-se com as nossas interações sociais, sendo o que faz a ponte entre o eu subjetivo e o eu objetivo. Isto é, podemos não ser exatamente o que pensamos ser, mas não seremos também exclusivamente o que achamos que os outros pensam que somos. Tudo isto culmina num conjunto de crenças sobre nós mesmos, que se revela no nosso comportamento e na forma como estamos perante o outro. Está, assim, relacionado com a crença individual que inclui características pessoais, bem como responde às questões sobre quem e o que é o self. De acordo com Carl Rogers, é ainda possível distinguir três constituintes do autoconceito: a visão que temos de nós próprios, ou autoimagem; o valor que atribuímos a nós próprios, ou autoestima, e quem idealizamos ser, o “eu ideal”.

Autoestima

A autoestima é, na sua essência, um conceito mais incisivo, no sentido em que diz respeito a uma auto-avaliação. Isto é, a forma como nos vemos (autoimagem) e a forma como me percebo (autoconceito), influenciam e moldam a nossa autoestima, dependendo que como concebemos a nossa imagem e o conceito que criamos de nós próprios. Ou seja, se nos percecionamos como pessoa resiliente, tenderemos a comportar-nos de forma resiliente. Na construção da nossa autoestima, refletimos o que sentimos em relação a nós próprios, projetada pela imagem que foi sendo criada. Ao longo do desenvolvimento seremos capazes de interpretar e formular uma autoestima que não está apenas dependente da opinião e julgamento do outro, valorizando o que gostamos em nós. Não é segredo que uma autoestima positiva pode ter benefícios ao nível da segurança e confiança no próprio, nas suas competências enquanto ser humano e na procura de momentos positivos que criem sentimentos benéficos ao nosso bem-estar.

 

Em suma, todos estes conceitos são fundamentais na interpretação do nosso ser enquanto todo. Cada um tem uma função e características que contribuem para a criação e fundamentação da nossa identidade individual. Por um lado o autoconceito é um construto mais abrangente do que a autoimagem, envolvendo a forma como nos vemos, pensamos e sentimos sobre nós próprios. Por outro lado, a autoimagem, que pode ser vista enquanto “ingrediente” do autoconceito, está muito ligada à autoestima, visto que a forma como nos vemos contribui muito para a forma como nos sentimos connosco. A autoestima é, então, o bolo inteiro por assim dizer. É a noção de respeito por nós próprios, como nos sentimos connosco, quer de forma positiva, quer negativa.

Todos são construtos fundamentais. Todos são variáveis e altamente subjetivos. O mais importante? Não ficarmos presos a imagens, pensamentos ou sentimentos estanques. E se algum destes estiver a falhar ou a não corresponder ao pretendido? Procurar ajuda, nos pares, nas pessoas signigicativas, e estarmos atentos, olhando para dentro, para não descurar a nossa identidade. No final de contas, ninguém pode cuidar melhor de nós do que nós próprios, certo?

 

Filipa César
Psicóloga Clínica e da Saúde

Partilhar